*Por Maria Rachel Coelho
No último dia 20 de novembro foi divulgado pelo Ministério da Educação os resultados do último Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).A nota média nacional na prova objetiva caiu quase dez pontos em relação ao ano passado: de 51,52 em 2007 para 41,69 em 2008. O Enem teve 2,9 milhões de participantes.
No mesmo dia a Câmara dos Deputados aprovou o PL nº 73, que vai garantir a política de cotas nas Universidades Federais e nas escolas técnicas. Além das cotas raciais, haverá a cota social, baseada na renda familiar, para beneficiar os estudantes mais pobres. Dentro da reserva dos 50%, agora há dois critérios: a renda familiar de até um salário e meio per capita e a racial. Neste último, haverá uma porcentagem proporcional ao número de negros, pardos e índios, habitantes de cada Estado.
Duas frustrações.
A primeira , porque a Câmara havia assumido um compromisso de, neste ano, nos 120 anos da abolição, nos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, nos 20 anos da Assembléia Nacional Constituinte, aprovar o Estatuto da Igualdade Racial, já aprovado no Senado. O Estatuto da Igualdade Racial é feito de políticas afirmativas que, nos Estados Unidos, foram aprovadas ainda na década de 60. Nós, 48 anos depois, estamos discutindo se vamos aprovar ou não políticas afirmativas. Vale lembrar que o projeto volta para o senado por conta de uma emenda que sofreu e que alguns senadores já garantiram que vão aperfeiçoá-lo.
O projeto traz uma ilusão. A cota para pessoas de baixa renda é uma ilusão porque os pobres, com raríssimas exeções não terminam o ensino médio.
A solução definitiva que é uma escola pública de qualidade para todos fica distante pois o sistema de cotas leva a um acomodamento na luta para melhorar a escola pública. O povo, equivocadamente imagina que não é preciso melhorar a escola pois já tem a cota. Só que eles não vão concluir o ensino médio.
Uma emenda feita na Câmara e que será aperfeiçoada no senado é a dispensa do vestibular. Num país em que as escolas são todas iguais, como a Finlândia, as notas das escolas bastam. Mas, num País com as nossas desigualdades, isso não funciona. A nota da escola é irreal para saber quem é melhor ou quem é pior. Um aluno de uma escola de altíssima qualidade, vai ter nota pior do que outro de uma escola pequena cujos professores decidiram dar nota 10 para todos. Esses entrariam na universidade, e aquele ficaria de fora. Isso será debatido e resolvido no senado.
Mas e quem vai resolver o problema do Brasil para o futuro? Se estamos caminhando nesse passo, piorando a avaliação de um ano para outro. Vamos continuar discutindo cotas, que evidentemente ainda são necessárias ou vamos começar a mudança para que um dia não precisemos delas?
O Estatuto da Igualdade Racial há dez anos em debate.. Será que vamos ficar mais dez anos esperando a boa vontade dos deputados, para que votem o Estatuto? Será que o Brasil não pode, 48 anos depois dos Estados Unidos, aprovar o Estatuto da Igualdade Racial? Talvez com o Estatuto aprovado nós não precisemos esperar quarenta e oito anos para se dizer que não precisamos mais de ações afirmativas.
Temos que deixar de ser um país de cotas, e sermos um país apenas desigual pelo talento, pela persistência, pela dedicação e pela vocação.
A outra frustração foi o resultado do Enem e trazendo uma piora nas ciências exatas, que é a área que vai permitir ciência e tecnologia, embora tenha havido uma melhora na redação. Vamos começar a investir em produtos nossos feitos aqui ou vamos continuar pagando ciência e tecnologia de fora? O Brasil não exporta inteligência, sistemas e chips porque não tem. Temos que produzir conhecimento e não importar dos outros e ficarmos apenas na produção material de bens primários, usando as mãos no lugar dos cérebros.
O MEC se contenta em comemorar quantos foram mal alfabetizados mas não se preocupa em quantos faltam ser alfabetizados. Amostras de 97% de matriculados que não significam freqüência, assistência e permanência até o final do ensino básico ou médio.
Por enquanto, precisamos das bolsas e das cotas mas nenhum dos dois é transformador. Precisamos urgentemente começar uma mudança profunda, e não ficar em simples ajustes provisórios. Podemos ser um Brasil de soluções permanentes. Precisamos erradicar a pobreza e não administrá-la .
Não podemos mais nos contentar em dar continuidade a isso. O Brasil não é um país de bolsas e cotas. Nós também podemos!
Artigo publicado:
em 23/11/2008 no
http://www.ncpam.com/e no Blog Cidadania e Justiça em 24/11/2008